Recebi, com muito orgulho, pela Câmara Municipal, o título de Cidadão de Salvador, iniciativa do vereador Duda Sanches. Nasci em uma terra que soma dois símbolos imensos do amor: Coração e Maria. Contudo, aos 9 anos, eu escolhi Salvador para morar. E sei que quando a gente escolhe, o amor é diferente.
Dos meus 59 anos, 50 passei aqui. Aos nove anos, vim para ser interno do Colégio 2 de Julho. Tempo em que você decide se será tricolor ou rubro-negro. Não esqueço da minha primeira vez na Fonte Nova. A sensação imorredoura de ver o meu Bahêea ser campeão, em 1967, com um gol de Canhoteiro em cima do Galícia, o “Demolidor de Campeões”.
Em Salvador, tive que dar duro e estudar para passar no concorrido teste para o Colégio da Bahia. Gilberto Gil canta que a Bahia lhe deu “régua e compasso”. A velha cidade da Bahia me deu muito mais do que isso: estudar, conhecer, aprender, desvendar. Na Escola Técnica Federal da Bahia, no Barbalho, conheci gente do baralho e do barulho. Depois, me formei em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Bahia.
E foi no Jardim Apipema que tive a sorte de receber o primeiro beijo de Eleusa, a minha mulher. Em Coração começou o flerte, mas foi aqui que o clima esquentou e que o namoro se firmou. Como não celebrar a capital do meu primeiro, único e verdadeiro grande amor?
É verdade: não nasci aqui, mas aqui brotaram os frutos de minha árvore, meus filhos, soteropolitanos da gema, Angelo Filho e Diego Coronel. E que me abençoaram com os filhos deles, meus três netos. E quem não experimentou ainda, eu recomendo o inigualável amor de avô.
Podia ter ficado em minha terra natal, podia terá fincado raízes no Recôncavo como um mourão de cerca, mas a cidade que me acolheu ainda menino me seduziu. Serão os mistérios dessa cidade, que Jorge Amado conta em “Capitães de Areia”, em “Jubiabá”, em “Mar Morto”, em “Dona Flor”?
Muita coisa mudou, muitas transformações nessa metrópole desde que aqui cheguei, em 1967. Mas o olhar do menino continua o mesmo, deslumbrado pela visão da Baía de Todos os Santos; inebriado pelo cheiro da arruda; e paralisado pelo prazer da primeira mordida no acarajé.
A alquimia dessa cidade, que o cantador Gerônimo diz que “todo mundo é de Oxum”, tenho certeza, não está na topografia, nas praias de Itapuã ou do Porto da Barra, no casario do Pelourinho, na imponência do Elevador Lacerda. O bom de Salvador está nesse povo, sofredor e guerreiro, operário e musical, estivador e poeta.
Há dias, levei meu pai para a sua morada eterna. Ele, um homem da roça, passou os seus últimos quatro anos comigo, em minha casa na beira do mar de Stella Maris. Não foi esta terra que o levou: foi esta cidade que o manteve ainda mais perto de mim.
Salvador que me carregou – pelo menos até agora – ao meu ápice na política: a honrosa missão de presidir a Assembleia Legislativa da Bahia. Obrigado, generosa e materna Salvador. Obrigado pelos grandes amigos que me deu. Obrigado pelo alimento em seu seio farto, abundante em força e fé, como a Colina do Bomfim. Sempre fui seu filho. Agora, tenho somente a certidão de batismo.